E se a União Europeia se desintegrar?

A União Europeia é, de facto, uma união criada para impedir que os países europeus se ataquem, depois de terem terminado os ímpetos imperialistas noutras geografias. A análise do Prof. Dr. Kudret Bulbul.

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E se a União Europeia se desintegrar?

Perspectiva Global 51

O futuro da União Europeia está a em discussão nos últimos anos, devido à decisão do Reino Unido de sair do bloco comunitário, à situação em Itália e noutros países europeus, ao racismo emergente, às expressões de ódio e, mais recentemente, devido às manifestações dos coletes amarelos. No programa desta semana, vou concentrar-me na questão da União Europeia, as suas conquistas e o seu futuro.

O que é a União Europeia?

A União Europeia é, de facto, uma união criada para impedir que os países europeus se ataquem, depois de terem terminado os ímpetos imperialistas noutras geografias. Os países constituintes da União Europeia não foram perturbados pela exploração global, exceto quando a guerra os afetou diretamente. Mas após duas guerras mundiais, em que estes países pagaram eles próprios o custo terrível desses conflitos e cuja fatura se estendeu também a toda a humanidade, os países europeus decidiram cooperar para evitar uma terceira guerra mundial.

 

O que traz a União Europeia: paz e pluralismo

O sucesso económico alcançado pela União Europeia é o resultado desta cooperação, da estabilidade e dos valores comuns. O sucesso económico foi o resultado desse ambiente. Yuval Noah Harari, um professor de história de Israel e professor da Universidade Hebraica de Jerusalém, disse na sua entrevista publicada no jornal turco Hürriyet na semana passada, que o principal êxito da União Europeia é ter trazido a paz ao continente europeu. Segundo ele, se a União Europeia entrar em colapso, a guerra pode voltar à Europa. As seguintes palavras de Harari são extremamente significativas, pois mostram que o projeto da União Europeia trouxe paz, pluralismo e tolerância à Europa:

"Não havia qualquer traço de tolerância na Europa medieval ... Todos eram católicos em Paris em 1 600. Quando um protestante entrou na cidade, os católicos mataram-no. Todos eram protestantes em Londres. Quando um católico entrou na cidade, os protestantes mataram-no. Durante aquele período, os judeus foram expulsos da Europa ... Ninguém gostava dos muçulmanos ... No entanto, os muçulmanos, católicos, ortodoxos arménios, gregos e búlgaros de diferentes seitas, viveram felizes em Istambul durante o mesmo período ".

 

Os valores da União Europeia

Quando se fala sobre os valores da União Europeia, geralmente são enumerados valores como a democracia, os direitos humanos, o Estado de direito, a liberdade, a igualdade, o pluralismo, a tolerância, a cooperação, a solidariedade e a rejeição da discriminação e das expressões de ódio. Sem dúvida, o conteúdo desses valores pode ser preenchido de diferentes maneiras em diferentes civilizações. No entanto, não é correto olhar para esses valores como tendo sido criados pela Europa. Como pode ser entendido a partir das declarações acima mencionadas de Harari, valores como os direitos humanos, o pluralismo e a tolerância, já eram amplamente mencionados na geografia islâmica muitos séculos antes, e são ainda muito recentes na Europa.

Embora estes valores já tenham sido adotados por outras civilizações e não pertençam apenas à Europa, é positivo que a União Europeia adote estes valores como os seus próprios valores. É uma expressão de autoconfiança.

Com a adoção destes valores, podemos dizer que a União Europeia conseguiu trazer a paz a si mesma e contribuiu para a paz em toda a região, até um certo ponto. A cooperação entre os países da União Europeia e os valores por si defendidos, equilibrou em certa medida a concorrência fatal entre os países que fazem parte do bloco comunitário. Esta situação é uma das mais importantes razões por detrás do período de paz de quase 80 anos entre os países europeus, que antes lutaram duas vezes com um intervalo de 25 anos, no início do século XX.

Quais são atualmente, os valores da União Europeia?

Parece que consigo ouvir a sua resposta: "a roupa de hoje não se seca com o sol hoje, e hoje em dia a União Europeia já deixou de ser uma união de valores". Na mesma linha, "a própria União Europeia hoje nem sequer poderia ser aceite como estado membro da União Europeia, porque não consegue cumprir com os seus próprios critérios". O racismo emergente, as expressões de ódio, as abordagens não humanas dos países europeus contra os refugiados, a fraqueza dos seus relatórios sobre direitos humanos e a substituição do pluralismo e da cooperação pelas abordagens fascistas, ameaçam claramente o futuro e os valores da União Europeia.

 

E se a União Europeia se desintegrar?

Devido às preocupações económicas, à crescente influência dos partidos fascistas e à perda da qualidade dos valores residuais, a probabilidade de desintegração da União Europeia está a ser abertamente discutida. Devido a estes desenvolvimentos e às políticas hipócritas e sem princípios em algumas questões, há quem diga que a União Europeia já deixou de cumprir a sua função e, portanto, a sua desintegração não causará um sério problema. Mas receio que a desintegração da União Europeia possa causar graves danos a si própria, à sua região e à humanidade. Em primeiro lugar, não se deve esquecer que os tempos mais cruéis do imperialismo ocidental foram experimentados antes do processo da União Europeia. Os países europeus, despojados dos valores da União Europeia e uns dos outros, podem ser muito mais imprevisíveis.

Vamos explicar as nossas preocupações com algumas perguntas:

1. Se a União Europeia deixar de existir, o que equilibrará os países europeus na sua procura por imperialismo global? O que limitará sua rivalidade fatal e violenta do passado? Em resposta a essa preocupação, pode-se dizer que a União Europeia e os países da União Europeia já deixaram de ser atores globais, tendo-se transformado em atores incapazes, que estão presos entre os Estados Unidos e a Rússia e que não conseguem desenvolver políticas para colmatar o desenvolvimento da China. Se acreditarmos neste pressuposto, na ausência do teto que a União Europeia dá à Europa, os países da União Europeia passarão novamente a ser atores globais. E esta situação não aumentará o risco de conflito na Europa e na sua região envolvente?

2. Numa situação em que a União Europeia deixe de existir, para que servirá a competição sem limites em termos de certos princípios e valores na Europa?

3. Atualmente, os valores da União Europeia estão gradualmente a desaparecer na Europa. Os movimentos racistas, neonazis e neofascistas, estão a aumentar rapidamente. Há muito poucos estadistas na Europa que não se renderam a esses movimentos. Merkel parece ser o último nome prudente. A desintegração da União Europeia não produzirá muito mais intimidação e racismo para os imigrantes e muçulmanos que vivem na Europa, e depois para a própria Europa?

4. O colapso da União Europeia enfraquecerá valores como a democracia, os direitos humanos, a cooperação, o pluralismo e a sociedade aberta, e promoverá as abordagens mais conservadoras, nacionalistas, autoritárias e talvez mais totalitárias do mundo. Essa situação não afetará a vida individual de maneira muito mais negativa?

5. O teto da União Europeia desempenha um papel tranquilizador para países que têm regiões separatistas como o Reino Unido, a França, a Espanha e a Itália. Na ausência do teto da União Europeia, não aumentará o risco de conflito?

Como se pode ver, é evidente que a desintegração da União Europeia, as crescentes declarações racistas e isolacionistas, bem como a linguagem do ódio, ameaçam mais o futuro da Europa. Perguntemos uma vez mais aos grupos pluralistas, libertários e democráticos europeus: estão cientes do perigo?

Esta foi a análise sobre este assunto do Prof. Dr. Kudret Bulbul, decano da Faculdade de Ciências Políticas da Universidade Yildirim Beyazit em Ancara



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