As novas vítimas dos deuses: Rohingyas

A análise dos temas da atualidade por Erdal Simsek.

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As novas vítimas dos deuses: Rohingyas

Uma minoria está há meses a ser sistematicamente morta por um país soberano, que é a pátria desses cidadãos. As suas vilas e aldeias estão a ser queimadas. Seria bom se apenas as suas casas e cidades estivessem a ser queimadas. Mas as pessoas estão também a ser queimadas, sem discriminar entre crianças, idosos e mulheres. Quando não morrem queimados, os Rohingyas são mortos com facas de talhante. As crianças e os idosos são atirados para águas traiçoeiras e acabam por se afogar nessas águas. Monges budistas, soldados e civis, apoiados pelo próprio estado e pela sua administração, são quem está por detrás de toda esta violência.

Quem está a ser morto em Myanmar não são os Rohingyas, mas sim a própria humanidade. Todas as organizações internacionais e a ONU em particular, estão em silêncio perante este massacre. Apesar das vítimas serem muçulmanos de Rohingya, dezenas de países islâmicos mantiveram-se em silêncio em relação a esta situação. Apenas o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, reagiu contra este massacre e trouxe-o para a agenda internacional.

A União Europeia e os países ocidentais, que são muito sensíveis não apenas à questão dos direitos humanos mas também aos direitos dos animais e do ambiente, mantiveram-se todos em silêncio acerca desta selvajaria.

Todos os valores humanos da Europa e do Ocidente, adotados desde há cerca de 35 anos, deixaram de ser respeitados pelo próprio mundo ocidental. E agora o Ocidente deixou de ter argumentos. Sempre que o Ocidente, e em particular a União Europeia apela aos “direitos humanos” e à “democracia”, toda a gente sabe que há um benefício económico associado a estas palavras. Estas verdades amargas são bem conhecidas do povo do Ocidente, cujas consciências ainda não morreram. O mundo Ocidental ficará para a história como uma civilização que se destrói a si própria, por não respeitar os seus próprios valores. E eu temo que iremos testemunhar este drama.

O Ocidente assinou a sua própria sentença de morte, quando se recusou a olhar para o genocídio cometido pelos sérvios na Bósnia Herzegovina, no coração da Europa, há um quarto de século. E depois surgiu a sua atitude em relação à guerra civil na Libéria. E claro, já para não falar da ocupação do Iraque e do Afeganistão, baseada em alegações e não em factos, e que trouxe o Ocidente para uma posição em que foi destruída a confiança nas suas posições. A atitude ocidental em relação à Primavera Árabe, fez ruir as últimas esperanças.

Eu penso que o último fôlego dos valores ocidentais foi asfixiado, quando o Ocidente se mostrou a favor do golpe para derrubar Muhammad Morsi, que foi eleito pela maioria do povo egípcio através de métodos democráticos.

E quando o Ocidente deu o seu apoio aos golpistas que tentaram derrubar o presidente democraticamente eleito da Turquia, foi revelado o último acontecimento que demonstra a hipocrisia do Ocidente. Os soldados que tentaram executar o golpe na Turquia, mataram centenas de civis e deixaram milhares de feridos. O mundo ocidental e a União Europeia acolheram estes terroristas, atribuindo-lhes o estatuto de refugiados de pleno direito.

Ninguém está agora furioso, com a selvajaria que se está a passar atualmente e da mesma forma, na região ocidental de Rohingya. Agora, as pessoas sabem que conceitos como a democracia, igualdade, direitos humanos e moralidade, são apenas instrumentos usados a favor dos interesses do Ocidente.

O que se passou em Rohingya, é na verdade a cópia perfeita das guerras por procuração que se vivem na Síria, no Iraque e na Líbia.

A maior potência económica e política do mundo ocidental, não quer que a China se assuma como uma potência económica, nem que a Rota da Seda se torne novamente funcional.

Mais de metade das rotas marítimas comerciais do mundo, passam pelo Estreito de Arakan. Há também petróleo e gasodutos que atravessam a China e que passam pela região do Estreito de Arakan. Estas duas linhas de energia são muito importantes para a China, e caso sejam interrompidas irão tornar a economia chinesa mais frágil. A região de Rohingya é atravessada por pipelines que abastecem a China.

O estado de Myanmar impôs todo o tipo de opressão e violência contra os muçulmanos Rohingya, desde que o país se tornou independente. Mas desde 2 010, esta pressão deu lugar ao genocídio e à violência étnica. A violência criou mais violência, e de repente surgiu uma organização terrorista, equipada com as armas mais modernas e extremamente caras. Mas isto numa região onde a população Rohingya luta contra a fome. Esta organização terrorista, supostamente deveria lutar pelos direitos dos Rohingyas. Mas todas as ações deste grupo só fizeram com que morressem Rohingyas e que este povo fosse forçado ao exílio.

Os maiores pipelines de energia chineses e cerca de 80% das rotas comerciais marítimas da China, passam pelo Estreito de Arakan. E por isso, os países que olham para a China como uma ameaça económica, estão à procura de novas medidas.

Afinal, parece que as intenções das potências ocidentais quando entraram no Afeganistão e no Iraque, para destruir as suas supostas armas de destruição maciça, eram diferentes do que parecia.

Não é estranho que o Ocidente não tenha intelectuais a questionar o porquê das tropas das potências ocidentais estarem ainda nestes países, mesmo depois de se saber que não existem armas nucleares ou armas de destruição maciça?

A guerra por procuração que o Ocidente lançou no Médio Oriente desde 1 991, agora espalhou-se também à Ásia. Eu espero que a sabedoria do estado de Myanmar se torne dominante, e que o país se liberte a si mesmo do vórtice para o qual foi arrastado. Eles estão a tentar mudar o mapa étnico, político e de segurança da região, através da concretização do genocídio dos muçulmanos de Rohingya. Estes acontecimentos não se limitarão apenas aos Rohingyas. Eu espero e rezo para que o mundo não volte a tornar-se num instrumento desta guerra suja por procuração.



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