Myanmar, o novo campo de batalha para os centros de poder

A análise dos temas da atualidade por Erdal Simsek.

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Myanmar, o novo campo de batalha para os centros de poder

Eu encontrei-me com os Rohingyas e com a minoria muçulmana “sem estado” em Rohingya no início do ano 2 000. Durante essa década, as agências internacionais informaram que o governo da junta militar em Myanmar estava a cometer crimes contra a democracia e contra a liberdade de pensamento no país. Por isso fui a esse país, a Myanmar, como parte do meu trabalho. O país estava a ser governado de facto por uma junta militar, mas eu pude fazer o meu trabalho sem me defrontar com grandes pressões. Naquela altura encontrámos uma forma de nos reunirmos com a atual presidente de facto, Ang San Suu Ki, que nessa época estava em prisão domiciliária.

Ang San Suu Ki, que era vista pelo Ocidente como uma heroína da democracia, era muito influenciada pela ala nacionalista de esquerda. O mundo ocidental ignorou esta situação. Mas foi precisamente o mundo ocidental que causou o maior número de vítimas por parte da doença da ala nacionalista de esquerda.

A ala nacionalista de esquerda que Hitler criou na Alemanha na década de 30, ou dito por outras palavras, o nazismo, custou a vida a milhões de pessoas na Europa e no mundo.

A doença do nazismo está novamente a ressurgir na Europa. Na Alemanha, a ala nacionalista de esquerda, tanto no discurso como no pensamento, está-se a espalhar não apenas entre os Sociais Democratas, mas também entre os Verdes, os grupos de Esquerda e também entre a ala direita.

Eu estou certo que o leitor ficará chocado com as semelhanças entre os discursos da chanceler Angela Merkel, na sua atual campanha eleitoral, com os discursos de Hitler durante o seu tempo. Infelizmente, a mesma ideia doente está-se a espalhar passo a passo para outros países europeus. Por isso, a Europa Ocidental e a União Europeia em particular, que se vangloria de ser “o berço da democracia e a herdeira da Civilização Ocidental”, não vê nem quer ver o massacre e o genocídio sistemático que ocorre no estado de Myanmar.

Qual a razão pela qual a Europa e a União Europeia, que incomodou Myanmar no início da década de 2 000 sob o pretexto de que as pessoas no país não podiam expressar as suas ideias sem medo, se mantém agora em silêncio perante o genocídio que ocorre em Myanmar?

Será que o Comité do Prémio Nobel, que ocupa um lugar respeitável no mundo, irá reunir de forma sincera para analisar o prémio que deu à senhora Ang San Suu Ki, a presidente de facto de Myanmar, que ordenou este massacre?

Erdogan, o presidente da República da Turquia, pediu ao governo do Bangladesh que aceitasse os Rohingyas como refugiados. Erdogan anunciou também ao mundo que a Turquia irá pagar todas as despesas com os refugiados. Isto apesar da Malásia e da Indonésia estarem mesmo ao pé dos Rohingyas. Ambos os países são de maioria muçulmana e potências regionais.

É vergonhoso para o mundo muçulmano e para os muçulmanos de que esta questão nem sequer seja referida pelos países do Golfo Pérsico, atualmente as economias mais poderosas do mundo.

Os Rohingyas são maior minoria do mundo sem um estado. Eles carecem de todos os direitos humanos básicos, como um cartão de identidade para as suas crianças, um passaporte para poderem fugir ou um tribunal para fazerem valer os seus direitos. Myanmar retirou-lhes estes direitos desde há precisamente 60 anos, desde que declarou a sua independência.

Uma organização chamada “Exército de Libertação Rohingya”, equipado com armas muito caras, surgiu na região onde os muçulmanos têm dificuldade em encontrar comida. As ações deste grupo são muito semelhantes às do DAESH, um grupo nascido no Ocidente. Esta organização e o exército de Myanmar estão supostamente em confronto, mas são sempre os civis quem está a morrer. Não existe sequer um único terrorista capturado vivo ou morto.

Tal como no último conflito, foram os civis quem pagou e continua a pagar o maior preço. Pelo menos 3 mil muçulmanos Rohingya perderam a vida. O exército de Myanmar está a aumentar a dimensão da violência. Eles queimam quase 20 aldeias por dia. Não é possível saber o número exato. Anteriormente, tinham surgido informações de que duas a três mil pessoas tinham perdido a vida, desde que o conflito começou. Este é o único número que pode ser confirmado.

Mas este número também não reflete a verdade. Isto porque as agências informativas independentes, ao longo dos últimos dias, indicaram que 1 500 pessoas foram mortas em várias aldeias, e isto apenas na região de Buthidaung. Apenas 400 pessoas sobreviveram nesta enorme aldeia. Nesta aldeia, os restantes habitantes foram queimados vivos.

O sistema de massacres executados pelo exército de Myanmar, segue a seguinte sequência: em primeiro lugar, o exército entra nas aldeias com armas e machetes. Eles matam tantas pessoas quanto podem. Os budistas também ajudam os soldados. Os que conseguem, fogem da aldeia mas nessa altura tornam-se vítimas das minas que foram colocadas à volta da aldeia. Há também soldados prontos a fazer emboscadas. Os fugitivos são alvejados com rockets. Depois de concretizados os massacres, as aldeias são queimadas. A maior parte dos aldeãos feridos tem queimaduras de terceiro grau.

Atualmente, 70-80% dos muçulmanos de Myanmar são mulheres e crianças. A maior parte dos jovens e dos homens das regiões de Maungdaw e de Buthidaung fugiram para o Bangladesh e para a Malásia. As mulheres e as crianças permanecem nas aldeias. Por este motivo, as vítimas estão no geral a ser bem acolhidas.

A região de Maundaw fica muito próxima do Bangladesh. Aqueles que aí vivem, estão a fugir para a fronteira. No entanto, o estado do Bangladesh, cuja população é aparentada à dos muçulmanos de Myanmar, não abre a fronteira. Existe uma zona neutra e é aqui que muitas pessoas se refugiam. Aqueles que fugiram de zonas mais longe da fronteira, estão escondidos nas florestas.

O exército do Bangladesh está a empurrar os insurgentes para o interior, enquanto que o exército de Myanmar também os alveja de forma aleatória.

É embaraçoso para a humanidade, que mais nenhum país para além da Turquia esteja a dar voz a esta brutalidade. O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, fez um esforço para travar este massacre ao nível internacional, telefonando a todos os líderes internacionais, um a um, durante a festa do sacrifício.

Eu esperava e desejava ter gostado de dizer que as Nações Unidas tomaram passos sérios para travar este massacre, o mais depressa possível. Mas não existem quaisquer sinais de que o derramamento de sangue irá parar na região, que serve de palco às lutas de poder entre alguns países membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

A inexperiente líder de Myanmar, Ang San Suu Ki, não tem consciência de que o genocídio que ela ordenou tornou o seu país num centro pela luta de poder. E quando ela se tornou consciente desta situação, é como se fossemos escrever notícias sobre a morte dos budistas que hoje matam muçulmanos.

No próximo artigo, tentarei explicar porque é que Rohingya e Myanmar se tornaram num novo campo de batalha. Até ao próximo artigo.



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