A caminho do referendo para a independência do norte do Iraque…

A análise de Cemil Dogaç Ipek, investigador de Relações Internacionais na Universidade Ataturk.

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A caminho do referendo para a independência do norte do Iraque…

A administração regional do norte do Iraque, anunciou que irá realizar a 25 de setembro de 2 017, um referendo para a independência da região. No nosso programa desta semana, vamos analisar este referendo, bem como o seu impacto sobre a região.

Massoud Barzani, o líder da administração regional do norte do Iraque, fez o anúncio oficial de que o referendo sobre a independência desta região terá lugar no dia 25 de setembro de 2 017. A administração da região ainda não conseguiu receber apoio interno e externo para este referendo. Ao redor do Partido Democrático do Curdistão, nenhum dos grandes partidos fez uma declaração oficial de apoio ao referendo. Quanto aos turcomenos e aos árabes - que representam uma grande percentagem da população na região – não são favoráveis à realização deste referendo.

O desejo de independência da família Barzani não é recente. Adicionalmente, o referendo sobre a independência já não é uma novidade política para os curdos, pois o seu desejo de independência já vem desde há perto de um século. Em 1 921, os curdos não se mostraram favoráveis a um país (o Iraque), mandatado pelos britânicos. Eles iniciaram um levantamento em 1 932, sob a liderança de Mollah Ahmet Barzani, mas não conseguiram atingir o seu objetivo. Esta questão mantém o seu lugar na agenda dos curdos, depois da ocupação do Iraque por parte dos Estados Unidos.

Nos últimos anos, a administração regional nunca conseguiu pagar de forma regular os salários aos seus funcionários. E em cima desta situação, mais de um milhão de iraquianos viram-se forçados a emigrar para zonas controladas pela administração regional do norte do Iraque, na sequência do surgimento do DAESH e dos conflitos.

Apesar de todos estes problemas, alguns desenvolvimentos foram positivos para esta administração regional. A coligação internacional, constituída para combater o DAESH, inclui desde há dois anos as forças Peshmerga. Ao contrário do que se passava há dois anos, a administração regional do norte do Iraque tem atualmente uma força armada mais profissional, melhor organizada e mais bem equipada em termos de armas. Adicionalmente, os Peshmerga instalaram-se em regiões de onde o DEASH foi expulso, e não as abandonam. Uma grande parte das zonas disputadas desde 2 005, entre a administração central iraquiana e a administração regional do norte do Iraque, estão hoje em dia sob o controlo da administração regional. As regiões potencialmente ricas em petróleo a norte de Mossul, bem como as áreas com reservas petrolíferas em Kirkuk, fazem parte destas zonas disputadas.

Uma das principais motivações de Barzani para a realização do referendo, é a seguinte: Ele quer proclamar a independência, sem se apresentar como candidato com o tema do referendo. E desta forma, ele vai apoiar um chefe de estado provisório. Se, em 2 018, a milícia que será reforçada no Iraque, conseguir levar Maliki ou um político semelhante ao poder, ele conseguirá obter a independência e tornar-se-á no primeiro chefe de um estado curdo.

Os árabes e os turcomenos do Iraque, um dos povos mais antigos na região, reagiram fortemente contra a decisão do referendo. No entanto, eles não têm nenhuma política nem forças armadas capazes de impedir a realização deste referendo. Se os árabes e os turcomenos se reforçarem no futuro, irão fazer o que lhes for possível para retomarem a sua terra.

Do ponto de vista dos países da região, a conjuntura mudou nos últimos anos. Desde o início da crise do Qatar, a Arábia Saudita leva a cabo atividades junto da opinião pública, com o objetivo de apoiar a independência da administração regional do norte do Iraque. Quanto a Israel, o país declara agora abertamente o seu apoio de sempre a esta independência. No que toca à Turquia e ao Irão, dois atores importantes da região, ambos os países criticam a realização deste referendo.

A conjuntura no Iraque e no Médio Oriente, oferece uma grande oportunidade a Barzani. O processo da luta contra o DAESH, garantiu uma certa simpatia internacional por Barzani. Barzani deve seguramente pensar que não existirá um melhor momento para a independência, tendo em conta as fraquezas do governo iraquiano, o facto de se viverem várias guerras civis no Médio Oriente, e num contexto em que a atenção das forças regionais está orientada para outras questões.

Esta decisão de realizar o referendo, tendo em conta os sérios problemas que se vivem no Iraque, poderá aprofundar o caos na região. Por outro lado, a decisão de organizar este referendo assume um caráter unilateral, contrário à constituição do Iraque. Seja qual for o resultado do referendo, ele não irá trazer estabilidade à região. Pelo contrário, é altamente provável que novos conflitos possam surgir a seguir.

A tentativa de obter a independência por parte da administração regional do norte do Iraque, será uma séria provocação contra a administração central do Iraque, e contra a Turquia e o Irão. É bom lembrar que durante o mês de abril, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan teceu duras críticas contra a reivindicação de direitos sobre Kirkuk para os curdos e prometeu fazer retirar a bandeira curda que se hasteou na cidade:

“A Turquia não acredita em nenhum dos argumentos sem sentido, segundo os quais Kirkuk pertence aos curdos. Kirkuk pertence em simultâneo aos turcomenos, aos árabes e aos curdos que lá vivem. Se insistirem nesta reivindicação, dizendo que Kirkuk é dos curdos, o preço a pagar será muito caro” – avisou na altura Erdogan.

A decisão de realização do referendo, que foi tomada apesar da colaboração anterior, irá significar um duro golpe nas boas relações entre a Turquia e a administração regional do norte do Iraque. Em resumo, a integridade territorial do Iraque e a preservação da sua unidade política, são princípios sine qua non da política externa da Turquia. Seja qual for o resultado do referendo, será impossível à administração regional do norte do Iraque ter sucesso, sem o apoio da Turquia.



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