A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente

O regime debaixo do controlo do general Abdelfatah Khalil al-Sissi, que chegou ao poder no Egito após um golpe de estado, tomou como alvo todas as organizações não governamentais democráticas no Egito, depois de reprimir o movimento da irmandade muçulmana

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A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente

Os governos europeus e dos Estados Unidos têm uma perspetiva sobre o Egito que privilegia a estabilidade no país. Depois do Egito ter participado na aliança ocidental na época do presidente Anuar el-Sadate, este ponto de vista nunca mais mudou. Esta importância dada à estabilidade do Egito, teve como consequência a indiferença face ao regime autoritário e às violações dos direitos humanos no país. Neste contexto, os Estados Unidos e a Europa fecharam os olhos relativamente ao golpe de estado que em julho de 2 013 afastou do poder o presidente Mohammed Morsi, democraticamente eleito.

O facto de centenas de manifestantes terem perdido a vida em apenas um dia, e de dezenas de milhares de pessoas terem sido presas – com centenas delas a serem depois condenadas à pena capital – não motivou nenhuma reação por parte de Washington ou dos países europeus. Além disso, a Irmandade Muçulmana – que havia aceite fazer a sua política através de métodos democráticos – acabou por ser considerada uma organização terrorista. O regime militar egípcio aumentou a sua pressão para fazer desaparecer este movimento.

 O regime debaixo do controlo do general Abdelfatah Khalil al-Sissi, que chegou ao poder no Egito após um golpe de estado, tomou como alvo todas as organizações não governamentais democráticas no Egito, depois de reprimir o movimento da irmandade muçulmana.

As ONGs de cariz liberal e as de tendência de esquerda foram também afetadas pelas políticas de pressão. A prisão de Ahmet Maher – que teve um papel ativo na revolução de 25 de janeiro – e do ativista Alaa Abdel Fattah, mostra que o regime não tolera a mais pequena oposição. Tendo em conta as políticas de pressão exercidas, podemos mesmo dizer que Sissi ultrapassou o ex-governante egípcio Hosni Mubarak, que foi deposto na sequência da Primavera Árabe de 2 011.

Mas as pressões cada vez mais fortes do governo de Sissi sobre a sociedade civil, não permitem que o país produza e conduzem à criação de um cenário fantasioso, totalmente oposto à realidade. No longo prazo, a instabilidade, a tensão e os conflitos serão inevitáveis. Intervir duramente contra uma oposição construtiva, irá conduzir à sua marginalização e mais tarde às atividades clandestinas e à radicalização. Esta é uma situação que irá reforçar os elementos radicais da sociedade. A multiplicação dos ataques terroristas de forma geométrica, sobretudo na Península do Sinai desde a deposição de Morsi por um golpe de estado, é prova disto mesmo. Adicionalmente, regista-se um enorme aumento no número de militantes e de atos da organização Ansar Beit Al-Maqdis, que deixou a Al-Qaeda para se filiar no DAESH. Um avião de linha área comercial russo, foi também abatido por esta organização.

O pior é que uma vaga de descontentamento que possa causar uma nova revolta, começa a espalhar-se tal como aconteceu durante a revolta de 2 011. A pressão e a violência exercidas contra a sociedade civil sem qualquer tipo de distinção – sob o pretexto do crescimento do terrorismo que ameaça a segurança nacional – fizeram diminuir progressivamente a confiança dada por uma parte da sociedade à administração de Sissi.

O governo de Sissi está a partir de agora perante numerosas fações da sociedade civil que o poderiam ter apoiado no início do golpe de estado, mas que deixaram de o apoiar. E isto restringe o campo de atuação do ponto de vista da sua legitimidade. A liberdade de manifestação e de reunião do povo egípcio, foi consideravelmente restringida pelas novas leis. Além disso, as ONGs foram proibidas de receber donativos de países estrangeiros, seja qual for a origem desses donativos. O chefe de estado Sissi, batizou as suas políticas opressivas face à oposição de “guerra de 4ª geração”, que se traduz no sentido: “os media e a sociedade civil fazem parte de um complô contra o governo, para agitar a consideração do povo face aos líderes do país. Dito doutra forma,  todas as opiniões contra a opinião oficial, são um ataque ao estado egípcio”.

No momento atual, o estado egípcio concentra-se em três pontos: a repressão do terrorismo e da oposição, no assegurar de um fluxo de liquidez de milhões de dólares oriundos dos países do Golfo em direção ao Egito, e em dar mensagens positivas aos cidadãos relativamente ao futuro, através de reformas políticas.

Contudo, e como já referimos acima, a política antiterrorista seguida até agora agravou as coisas. Quanto à dependência financeira do Golfo, é uma situação que faz com que o Egito tenha deixado de ser um centro de atração. Deste ponto de vista, a Arábia Saudita substituiu o Egito a este respeito. O facto das ilhas de Sanafir e de Tiran terem sido devolvidas à Arábia Saudita a troco de 20 milhões de dólares, causou na população a sensação do seu território estar a ser vendido a outro estado e deu origem a manifestações que se traduziram na prisão de centenas de pessoas.

Do ponto de vista económico, houve desenvolvimentos positivos como o controlo da taxa de inflação, a baixa do desemprego e o aumento do crescimento económico. As quebras no fornecimento de eletricidade terminaram em 2 015. Contudo, estes desenvolvimentos positivos não chegam a toda a população. Pelo contrário, a situação das pessoas com baixos rendimentos deteriorou-se ainda mais. Uma grande parte da população do Egito vive com um rendimento inferior a dois dólares por dia, por pessoa.

Além disso, a eliminação dos subsídios para os produtos de primeira necessidade – enquadrada no âmbito das políticas de estabilização económica – deverá originar grandes reações por parte da população.

Dias sombrios são esperados no Egito. Para poder ultrapassar estes momentos difíceis, é preciso que o governo egípcio faça a paz com o seu próprio povo, o que implica estabelecer um consenso com os seus cidadãos sobre um novo pacto social. Se assim não for, o Egito deverá enfrentar sérios problemas políticos e sociais.



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