Tarrant é um terrorista cristão?

O terrorista australiano Brenton Tarrant martirizou 50 muçulmanos num ataque contra duas mesquitas, durante a oração de sexta-feira a 15 de março, na Nova Zelândia. A análise do Prof. Dr. Kudret Bulbul, decano da Faculdade de Ciência Política em Ancara.

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Tarrant é um terrorista cristão?

¿Tarrant es un terrorista cristiano?

O terrorista australiano Brenton Tarrant martirizou 50 muçulmanos e deixou dezenas de feridos, num ataque contra duas mesquitas durante a oração de sexta-feira a 15 de março, na Nova Zelândia. Apesar de não terem sido publicadas no Ocidente as imagens das mortes e do rasto de sangue após o ataque terrorista, essas imagens foram transmitidas em direto nas redes sociais. As redes virtuais e as televisões transmitiram repetidamente o ataque e a barbaridade com que se deparam os muçulmanos.

 

Um criminoso vulgar ou um terrorista?

Esta pergunta é tão justificada como dolorosa, face a este tipo de ataque. Mas quase nenhum meio de comunicação ou político ocidental classificou o ataque mais sangrento da história da Nova Zelândia, como sendo um “ataque terrorista”. Podemos descrever o terrorismo como sendo um “método de alcançar um objetivo político através da pressão, ameaça ou intimidação, usando força ou violência”.

Tarrant não se limitou a massacrar pessoas em direto, planeou-o durante anos e escreveu um manifesto de 74 páginas sobre a necessidade de matar todos os que não sejam de raça branca no Ocidente. Se Tarrant não é um terrorista e o seu ato não for considerado um ato terrorista, mais ninguém pode ser terrorista.

O facto de Tarrant saber todos os nomes, locais e acontecimentos relacionados com islamofobia e contra os turcos ao longo da história, e de ter escrito esses nomes nas suas armas, é outra prova de que não realizou sozinho este ataque e que o cometeu com apoio científico.

 

As democracias e as liberdades no Ocidente estão mais vulneráveis

O fascismo e o neonazismo aumentam cada vez mais na Europa devido à recessão económica. Em comparação com outros países democráticos, os partidos racistas estão no poder sobretudo na Europa. O aumento da importância destes partidos políticos, faz com que se calem as vozes pluralistas e liberais nos países ocidentais. No ponto atual, aumentam as ameaças contra os estilos de vida diferentes no Ocidente, e há cada vez menos líderes capazes de ver como esta ameaça os ataca, como aconteceu antes da II Guerra Mundial.

As partes com senso comum de todas as religiões, idiomas e raças no Ocidente, expressaram a sua reação contra o massacre de 50 muçulmanos. As reações de solidariedade destes círculos para com os muçulmanos, são muito valiosas tendo em conta o ambiente de pessão nos seus países. Apesar dos políticos ocidentais se terem mantido calados, os esforços da primeira ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, são muito importantes para mostrar que ainda há líderes humanos no Ocidente. Neste contexto de desespero e em que os muçulmanos se sentem impotentes e abandonados no seu país, é muito valioso que Ardern tenha visitado a comunidade muçulmana com véu islâmico. E as suas declarações são também uma resposta contra os terroristas racistas brancos: “Eles que não nasceram aqui são nós, por terem escolhido viver aqui. A pessoa que executou este ataque contra nós, não faz parte de nós”.

A resposta de Ardern foi como uma lição a Trump, que lhe perguntou “como poderia ajudar”: “Simpatia e amor para todas as comunidade muçulmanas” – respondeu Ardern.

 

Um terrorista cristão?

Enquanto os meios de comunicação e os políticos ocidentais estão ansiosos por classificar de jihadista os acontecimentos cujo autor é muçulmano, não vi nenhuma declaração classificando o massacre de Tarrant como “terrorismo cristão”. Mas no seu manifesto, Tarrant apela à violência contra todos os não brancos no Ocidente. Há muitas referências ao cristianismo no seu ataque e manifesto. Se for preciso relacionar um ataque com uma religião, há muitos motivos para relacionar este ataque com o cristianismo. Talvez classificar esta mentalidade agressiva do Ocidente com o terrorismo dos Cruzados e analisar o tema sob a perspetiva cruzada, poderia ser mais adequada.

Se nos opomos, e com razão, à tentativa de associar alguns atos violentos ao islão, também não deveremos classificar este ataque como terrorismo cristão. Porque isso serve aos terroristas, que querem associar o terrorismo às religiões, ideologias e valores. Será impossível alcançar a paz e a prosperidade, num mundo em que os muçulmanos são acusados de atos supostamente em nome do islão e os cristãos por atos em nome do cristianismo.

Mencionar atos terroristas juntamente com religiões, é um dos conceitos básicos de instrumentalização dos terroristas e que pode resultar na eliminação das tradições que nos protegem do extremismo das religiões desde há séculos.

Os muçulmanos, cristãos e judeus viveram juntos nos períodos em que dominou o islão. A jihad era mais eficaz e os países eram sobretudo governados pela sharia, de uma forma que nunca aconteceu noutras partes do mundo.

Os melhores exemplos de convivência e de pluralismo entre diferentes culturas, aconteceram na geografia otomana, Andaluzia e Índia, sob o domínio muçulmano. Nestes períodos, nenhum muçulmano poderia executar massacres contra pessoas inocentes, como aconteceu no 11 de setembro. E não seria possível atacar-se o seu próprio povo com aviões F-16, como aconteceu com a FETO.

As estátuas de Buda em Tora Bora foram destruídas nos tempos modernos, e não no tempo em que Afeganistão era governado pela Sharia e as pessoas atribuíam mais sentido à jihad.

A mentalidade por detrás do 11 de setembro nos EUA e do 15 de julho na Turquia, é a mesma do ataque de Tarrant. Estes 3 ataques mostram como um espírito de devoção sem princípios, regras, valores ou justiça, ataca as pessoas.

Não se deve permitir que os terroristas se escondam por detrás das religiões e que a mentalidade terrorista seja aceite, associando o terrorismo às religiões.

 

O que podemos fazer?

O facto de Tarrant ter realizado este massacre brutal com sangue frio e o ter transmitido ao vivo para todo o mundo, sem dúvida afetou o ambiente no Ocidente e as expressões racistas, separatistas e cheias de ódio dos meios de comunicação e de alguns políticos. Este acontecimento é um reflexo concreto da islamofobia e do ódio contra Erdogan no Ocidente.

Se terroristas como Tarrant, Bin Laden e a FETO são pessoas com a mesma mentalidade, os seus atos não devem ser legitimados e a luta deve ser conjunta.

A família da humanidade, em todo o mundo, deve mostrar a mesma reação sem desculpas contra os ataques terroristas. O mundo já é uma aldeia universal. As pessoas de todos os idiomas, religiões e de todas as opiniões, convivem em todos os lugares. Não devemos permitir que as pessoas de todas as religiões e opiniões que queiram acabar com a paz, a prosperidade e a liberdade no nosso mundo, nos afoguem no seu próprio obscurantismo.

Termino o programa desta semana com um apelo: “Pessoas com senso comum, unam-se. Caso contrário, é inevitável que o obscurantismo se propague através de ondas e nos capture a todos”.

Este programa foi escrito pelo Prof. Dr. Kudret Bulbul, decano da Faculdade de Ciência Política da Universidade Yildirim Beyazit em Ancara



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