O ímpeto político da Turquia no Ocidente

Um artigo de Can Acun, investigador da SETA - Fundação para os Estudos Políticos, Económicos e Sociais.

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O ímpeto político da Turquia no Ocidente

A Turquia está a criar novas redes de aliança, aproveitando as diferenças no Ocidente e dando passos para avançar com os seus próprios interesses. Já a seguir, apresentamos a opinião sobre este tema de Can Acun, investigador da SETA - Fundação para os Estudos Políticos, Económicos e Sociais.

Estamos a viver um período de transição, em que ainda não se pode assentar um novo sistema, em vez do atual sistema global centrado no Ocidente e que está gradualmente a desmoronar-se. O período em que estamos, é o reflexo de uma era caótica na ordem internacional, que implica grandes desafios mas também oportunidades para a Turquia.

A política externa da Turquia está a esforçar-se para se adaptar, com as suas medidas, a este processo de transição. Observamos que Ancara tenta estabelecer boas relações com as novas potências em crescimento como a Rússia, e por outro lado pretende beneficiar das diferenças no seio do Ocidente. Numa altura em que as relações entre a Turquia e os Estados Unidos estão tensas, a Ancara procura novos compromissos em separado com países como a França e o Reino Unido.

Neste contexto, ganha mais importância a recente visita a França do presidente Recep Tayyip Erdogan. É necessário sublinhar que houve importantes desenvolvimentos na área da defesa e das relações bilaterais entre a Turquia e a União Europeia.

As negociações com a Turquia tinham sido suspensas por causa da postura parcial da Alemanha, sobretudo durante o processo do referendo na Turquia. Isto, apesar do apelo do Parlamento Europeu para parar as negociações com a Turquia não ter sido aprovado pela Comissão Europeia, o que nos parece um indício. Macron defende um acordo de associação com a Turquia em vez da adesão à União Europeia, pondo assim fim à hipocrisia no processo de adesão tanto do lado europeu, como do lado turco. A União Europeia, que usa a detenção dos golpistas como uma desculpa para a tensão nas relações depois da intentona de golpe de estado de 15 de julho de 2 016 – levada a cabo pela FETO – está a trazer para a discussão a fórmula de cooperação através de França, o país mais próximo da Turquia.

Bruxelas, que vive problemas com origem nas tendências de extrema-direita, na crise económica e na saída do Reino Unido da UE, tenta desenvolver novas fórmulas para a Turquia e para o Reino Unido. O ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Sigmar Gabriel, disse que o modelo britânico poderá ser uma alternativa para a Turquia.

Por outro lado, há outros dois elementos fundamentais que tornam importante para a Turquia esta visita de Erdogan a França: a diversificação das alianças políticas e o aumento da cooperação na indústria de defesa.

A Turquia, que tem problemas com os Estados Unidos por causa do PKK/YPG, tem agora relações mais tensas com Washington depois de Trump ter reconhecido Jerusalém como a capital de Israel. Adicionalmente, a adoção de uma resolução histórica na ONU contra os Estados Unidos, liderada pela Turquia, fez aumentar esta tensão. Entretanto, a Turquia tomou passos para diversificar as suas alianças no mundo ocidental.

A Turquia, que continuou a sua relação com o Reino Unido e a França durante o período de relações problemáticas com a Holanda e a Alemanha, tenta maximizar os seus interesses nacionais ao adotar uma política de equilíbrio entre atores.

Na União Europeia, a França e a Alemanha serão os países mais fortes depois do Brexit. E com França em particular, as relações entre Ancara e Paris seguem por bom caminho. A França defende um avanço nas relações com a Turquia numa base racional, ao contrário do que se passa com a Alemanha. Para a Turquia, a cooperação com França é uma alternativa face à atitude negativa da Alemanha.

A cooperação na indústria de defesa é outro pilar da visita de Erdogan a França. O contrato Fase-B do Projeto de Sistema de Defesa Antimíssil de Logo Alcance, entre a EUROSAM e a Subsecretaria da Indústria de Defesa, foi assinado pelos presidentes de ambos os países e tem uma importância particular para a Turquia. A Itália também faz parte deste acordo.

A Turquia, que completou o seu acordo com a Rússia para a compra do Sistema Antimíssil S-400, está a esforçar-se para desenvolver um sistema antimíssil independente dos seus aliados na NATO. Desta forma, a Turquia tomou medidas contra possíveis perigos oriundos de qualquer parte, ao proteger o seu espaço aéreo com diversos sistemas.

A Turquia avançou recentemente com importantes projetos na indústria de defesa, e faz refletir a sua política de diversificação de alianças também neste setor. Perante o facto da antiga cooperação com a Alemanha e com os Estados Unidos, na área da defesa, estar a ser usada como instrumento de pressão política para ambos, a Turquia diversifica a sua colaboração com outros países como o Reino Unido, França, Rússia, Ucrânia, Paquistão e outros, e por outro lado reduz a sua dependência face ao exterior, ao potenciar a sua própria indústria de defesa.

Para além do que acabámos de indicar, foram também assinados numerosos acordos importantes durante a visita do presidente turco a França. O acordo de Resseguros Mútuos entre o EXIMBANK turco e a BPI France Assurance Export, e o memorando de entendimento entre a Airbus e a Turkish Airlines para negociar a compra de 25 aviões A350-900.

Em resumo, a Turquia está a criar novas redes de aliança, tirando proveito das diferenças no Ocidente e ao dar passos para avançar com os seus interesses. Estes passos fazem com que a Turquia tenha mais vantagens face a países como os Estados Unidos e a Alemanha.



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