A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente

O movimento Ennahda presidido por Rashid Gannouchi na Tunísia, realizou na semana passada o seu 10º congresso.

510382
A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente

(Transcrição do programa de rádio)

Olá caros ouvintes da Rádio TRT Voz da Turquia, sejam bem-vindos a mais uma edição do programa “A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente”. Hoje, vamos falar sobre alguns dos desenvolvimentos ocorridos na Tunísia.

O movimento Ennahda presidido por Rashid Gannouchi na Tunísia, realizou na semana passada o seu 10º congresso. Este congresso foi de grande importância, do ponto de vista da história do movimento e da história política da Tunísia. Depois deste congresso, foi aprovada a transformação de um movimento do islão político em partido democrata islâmico. A decisão tomada pelo movimento Ennahda motivou algumas reações. Os orgãos de comunicação social e os think tanks ocidentais, consideraram esta decisão como sendo o fim do islamismo. Já os escritores islâmicos, decidiram criticar a decisão tomada pelo Ennahda e afirmaram que o movimento saiu da sua trajetória inicial. Mas é preciso ver em que contexto foi tomada esta decisão, para podermos analisar esta tomada de posição. De outra forma, todas as análises não passariam de meras especulações.

É preciso olhar para os três lados desta situação, para poder fazer uma verdadeira análise. Os três fatores a considerar são a perceção do islão no sistema internacional, a forma de ver o islão político do ponto de vista dos equilíbrios no Médio Oriente e as dinâmicas interiores da Tunísia. No final da guerra fria e com o declínio do sistema soviético, o islão político ou islamismo, foi colocado em prática em substituição do comunismo. Dito de outra forma, o mundo ocidental considerou o islamismo como a sua nova ameaça em vez do comunismo. O perigo verde substituiu o perigo vermelho.

Esta situação foi mais evidente a seguir aos atentados do 11 de setembro. Apesar dos olhares se terem fixado mais tarde sobre os movimentos que usam a violência como o seu método preferencial, o islão político acabou por ser em geral marginalizado. Isto causou uma indiferença relativamente às políticas de pressão contra as formações políticas islâmicas. A derrota considerável do Egito e da Síria na sequência da guerra israelo-árabe de 1 967, causou uma crise na legitimidade do nacionalismo árabe. Os movimentos islâmicos preencheram o vazio causado por esta crise.

O facto dos movimentos islâmicos terem criado uma importante oposição potencial, também fez com que tivessem sido empregues políticas repressivas sobre estes movimentos, por parte dos regimes autoritários. Ao mesmo tempo, o facto do islamismo ter sido posto em prática como um substituto do comunismo, pelo menos em termos de perceção por parte do Ocidente, foi um favor político aos regimes autoritários.

A presença de regimes autoritários na região – uma situação indispensável para os interesses nacionais dos estados ocidentais – foi uma situação que se arrastou até aos nossos dias. O efeito político e psicológico da revolução iraniana de 1 979, veio reforçar ainda mais este favor. A revolução no Irão deu origem a uma nova guerra fria na região. A tensão entre o Irão e os Estados Unidos fez endurecer as posições dos regimes autoritários conservadores face ao islamismo político.

O desempenho dos partidos islamistas nos atos eleitorais “independentes” que tiveram lugar na sequência da Primavera Árabe, tornou a situação mais complicada. A chegada ao poder da Irmandade Muçulmana no Egito, pôs em causa a legitimidade popular e ideológica dos regimes autoritários. O golpe de estado no Egito e a guerra civil que se conhece na Líbia, surgiram na sequência da perceção desta ameaça.

Nestas condições, o movimento Ennahda sentiu uma ameaça à sua presença na Tunísia. É preciso também sublinhar que as organizações a favor da violência, tiram proveito da instabilidade na região. O DAESH e a Al Qaeda tomaram sob o seu controlo certas zonas do país, assolado pela instabilidade. A presença e a eficácia deste movimento, causou a conjuntura ideal para caminhar sobre os movimentos islâmicos. Deste ponto de vista, a Tunísia situa-se num ponto muito sensível.

É importante que o DAESH e a Al Qaeda tirem proveito da falta de autoridade na Líbia. A presença de jovens tunisinos no seio do DAESH, é outra situação que chama a atenção.

A Tunísia era um país que se distinguia pela sua laicidade radical antes da Primavera Árabe. O movimento Ennahda tinha ganho as primeiras eleições realizadas após a partida do destituído Zeybel Abidin Ben Ali, e formou um governo de coligação com dois partidos seculares. O Ennahda foi muito sensível aos valores dos grupos seculares, durante os trabalhos de preparação para a criação de uma nova constituição. Mas apesar de tudo isto, os meios seculares estavam à procura de ganhar vantagem face ao Ennahda, tal como aconteceu no caso do Egito, sob o pretexto de que a violência continuava no país. O movimento Ennahda ficou em segundo lugar nas eleições legislativas que se realizaram no final do ano de 2 014. Mas o facto de terem ficado em segundo lugar no governo de coligação, não diminuiu as ameaças.

Depois da separação de um importante grupo do partido no poder, o Ennahda tornou-se no maior partido representado no parlamento. Mas o Ennahda preferiu continuar como o elemento mais pequeno da coligação governamental. No momento atual, a Tunísia encontra-se face a graves dificuldades económicas por causa da instabilidade.

As manifestações sociais provocadas pelas dificuldades económicas, apresentam-se como uma ocasião para aqueles que desejam regressar ao regime autoritário. Se um regime autoritário chegasse novamente ao poder, o Ennahda seria sem dúvida a maior vítima. Neste contexto, a prioridade do Ennahda não é chegar ao poder.

A presença de organizações que apoiam a violência no norte de África e a participação de tunisinos nestas organizações, representa uma ameaça para a segurança do país. E por isso, esta ameaça a par dos problemas económicos, tornam “frágil” o processo de transformação.

O movimento Ennahda considera que será uma aventura tentar dirigir o barco tunisino enquanto navega pelo oceano agitado com as grandes ondas do Médio Oriente. Isto porque aqueles que querem deitar o Ennahda borda fora para travar as ondas, são ainda muito fortes e não há nada nem ninguém na conjuntura internacional que o possa impedir. O Ennahda tenta mostrar que é um elemento necessário para salvar o barco, e que este barco não pode navegar sem este movimento. E é por considerar tudo isto, que abandonou as suas missões e passou a dedicar-se à política profissional. O Ennahda considera que a política profissional no atual contexto da Tunísia, só será possível depois de concluído o processo de secularização do partido.

E termina por aqui o programa de hoje, “A Perspetiva da Turquia sobre o Médio Oriente”, regressa na próxima semana. A Rádio TRT Voz da Turquia agradece o seu interesse, e espera poder contar consigo na próxima edição. Até lá, fique bem.



Notícias relacionadas