Estará a direita em alta na América Latina?

Ocorre em alguns países da América Latina a subida das tendências de direita na política, que se materializou nas últimas eleições.

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Estará a direita em alta na América Latina?

A América Latina será palco de grandes mudanças políticas em 2 018. As eleições presidenciais que se vão realizar no Brasil, Colômbia, Venezuela e Paraguai, não determinarão apenas os destinos desses países, mas irão também definir a linha de rumo do continente sul-americano na próxima década.

A tendência esquerdista que começou com a chegada ao poder de Hugo Chávez na Venezuela, perdeu em grande medida a sua influência e agora as eleições começam a ser ganhas pelos políticos de direita. O último exemplo disto mesmo foi a vitória, por grande margem, de Sebastián Piñera no Chile.

Apesar da Venezuela ser neste momento o único país latino-americano onde ainda domina a política de esquerda, nos últimos 3 anos o país tem-se deparado com graves problemas económicos e sociais. Em 2 017, a inflação chegou na Venezuela aos 2 700% e milhões de pessoas abandonaram o país devido à crise económica, e são agora refugiados nos países vizinhos ou na Europa.

No Equador, onde também continua a imperar a influência da política de esquerda, há um grave conflito pelo poder entre o ex-presidente Rafael Correa e o presidente Lenin Moreno. Correa quer que seja continuada uma política de oposição frontal ao mundo ocidental, enquanto que Moreno deseja seguir uma abordagem de abertura parcial ao ocidente, por forma a equilibrar a grande influência que a China tem sobre o país. Por isso, Moreno não quer fechar as portas ao ocidente. Dito de outra forma, ao mesmo tempo que se acalma o vento da política de esquerda na América Latina, surgem conflitos sobre a visão do futuro e sobre as transformações na política esquerdista.

A situação geral que se vive atualmente é muito importante para se poder perceber o continente. A América Latina é um continente onde se fala espanhol em todos os países exceto no Brasil, e por isso todos os desenvolvimentos e as opiniões fácil e rapidamente se espalham de uns países para os outros. Esta situação em particular, garante uma rápida interação em todo o continente em termos de influências políticas, nos discursos e no idioma. Da mesma maneira, as formas de relacionamento, o seu estilo e até o conteúdo definido num país do continente com outras potências mundiais, podem ocasionalmente servir de exemplo para os países vizinhos.

Ao entrarmos em 2 018 na América Latina, verificamos que o Peru é o país com a mais alta taxa de desenvolvimento económico, na ordem dos 4,3%. O país entrou no novo ano com um desenvolvimento positivo mas num estado de crise séria. A novidade positiva, é o facto do Peru fazer parte do grupo de países que desde o início deste mês tomam assento temporário como membro do Conselho Segurança da ONU, pelo prazo de dois anos. Os outros novos países com assento temporário no Conselho de Segurança são a Guiné Equatorial, a Costa do Marfim, o Kuwait, a Polónia e a Holanda. Pela negativa, o ano de 2 018 começou para o Peru com o processo de destituição presidencial no parlamento, depois de terem sido revelados os subornos recebidos pelo presidente peruano Pedro Pablo Kuczynski, pagos pela empresa brasileira de construção Oderbrecht. Este processo deu depois origem a outra crise.

É possível destituir o presidente peruano com os votos de dois terços dos deputados do parlamento, o que implica o voto favorável de 137 assentos parlamentares. Mas no voto sobre esta matéria, 87 deputados não apoiaram a destituição e apenas 79 votaram a favor do cancelamento do mandato presidencial. No Peru, o parlamento é controlado pela oposição. Em condições normais, seria considerada como certa a destituição do presidente. Mas foi muito interessante ver como o presidente Kuczynski superou o perigo de destituição, devido à abstenção de 10 deputados do partido liderado por Kenji Fujimori - o irmão de Keiko Fujimori do Partido da Força Popular, que é filha do ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori.

Esta situação foi encarada como uma negociação política, que deu origem a fortes reações e a manifestações no Peru. Alberto Fujimori, o ex-presidente do país entre os anos de 1 990 e 2 000, estava há muitos anos na prisão por ter sido considerado responsável pela morte de 25 pessoas. Mas Fujimori foi recentemente, e de forma surpreendente, perdoado pelo presidente Kuczynski, logo após o voto que lhe permitiu continuar na presidência. Esta situação causou uma séria crise no país.

Alberto Fujimori é uma personalidade que divide a sociedade peruana, mas apesar disso continua a ser uma figura chave na política do país. Há praticamente tanta gente que o adora como quantos o detestam. Fujimori, e em particular durante o período que governou o país, foi acusado de violações dos direitos humanos e de ordenar o desaparecimento dos líderes populares locais. Por isso, existe na sociedade peruana uma forte oposição ao perdão que agora foi concedido ao ex-presidente. Quando o perdão foi anunciado, os peruanos saíram às ruas para protestarem a amnistia dada a Fujimori.

Neste processo, onde até agora não houve qualquer marcha atrás, quem mais perdeu foi sem dúvida o presidente Kuczynski. O presidente peruano chegou ao poder com uma imagem impoluta, mas perdeu completamente essa imagem e é agora seriamente questionado pela sociedade peruana, depois da decisão de perdoar Alberto Fujimori.

Nas eleições presidenciais do Peru em 2 016, Kuczynski concorreu contra Keiko, a filha de Alberto Fujimori, e venceu essas eleições por escassa margem em virtude da aliança das forças anti-Fujimori. Na primeira volta das eleições presidenciais, Kuczynski ficou em segundo lugar.

De acordo com o sistema político peruano, depois de ser eleito pela segunda vez para o cargo de presidente, os presidentes do Peru só poderão voltar a ocupar o cargo após uma ausência do cargo presidencial de pelo menos um mandato. A família de Fujimori, que encostou politicamente Kuczynski a um canto por este ter aceitado subornos, vai agora com grande probabilidade aumentar a sua influência política nos próximos tempos. O clã Fujimori, e tal como aconteceu nos últimos anos, surge como um ator determinante e eficaz na política peruana, e continuará a marcar presença na política do Peru.



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